- Pisque, acalme-se, pisque e respire, pisque, pisque! – Eram seus suspiros desesperados em meu ouvido, eu estava a três passos de me difundir naquelas águas gélidas e ela acreditava que piscar era um mantra, piscar seria um golpe rápido numa mente confusa, piscar e se esquecer, piscar e se perder entre o sim e o não, entre o claro e o escuro, piscar, piscar e transcender o esquecimento momentâneo.
Eu pisquei e regressei um passo e meio, talvez dois, ela se pôs sob os meus olhos, continuava linda - como podia ela conservar tal beleza após tantos anos? - seus olhos verdes como de costume eram cansados, mas seu sorriso carregava toda a graça do mundo, era encantador como o de princesas em contos de fadas – como podia continuar sorrindo após tantas chagas? - tocou o meu nariz, seus olhos lacrimejaram, por pouco uma lágrima ameaçou cair, talvez fosse pena ou coisa qualquer. Ostentou as minhas mãos e levou-as ao seu rosto, não tinha a mesma maciez de antes, mas foi incrível, ela não estava morta, eu podia sentir o seu calor, o sangue quente que o seu coração bombeava para fora das feridas. Da sua boca saia um vapor que me lembrava insistentemente um vulcão liberando cinzas, sim ela estava viva – como isso era possível?
Dos seus cabelos negros e escorridos exalava um cheiro doce de flores de laranjeira, me embriagava e me causava náuseas, mesmo assim me atraia ansiosamente, ela parecia um anjo enfeitado com asas de gente, gente como eu - como podia ela ter tantas cores em dias tão nublados? – sim ela estava viva, talvez mais viva que todos nós juntos.
Em um movimento brusco, porém de singelo carinho, me abraçou e me beijou o rosto, estupidamente continuei imóvel - ela está viva! – o mesmo pensamento se repetia incansável em mim, como ponteiros de um relógio marcando os segundos repetidos de uma vida inteira.
Depois de anos em sua ausência, senti uma vontade assustadora de empurrá-la precipício abaixo, de afogá-la naquelas águas frias, por alguns segundos senti meus olhos mudarem de cor, sendo tomados por tamanha ira, quis culpá-la por meus fracassos, perdas e medos. Ela não deveria ter me deixado, não deveria.
E antes que eu pudesse empurrá-la ou retribuir seu abraço, ela rapidamente se distanciou, me olhou nos olhos e mais uma vez pude contemplar seu sorriso, ela se foi, eu estava só novamente. Senti frio nas espinhas, um gosto amargo na boca, um peso nas costas - sim, eu estou morto! - sempre estive morto, talvez fosse o calor dela que me fizesse vivo todos aqueles anos, talvez fosse o seu cheiro que me acordasse todas as manhãs. Agora gelado e fétido, espero um lugar para repousar, uma pedra e uma data.
- Sim, eu estou morto.
Eu pisquei e regressei um passo e meio, talvez dois, ela se pôs sob os meus olhos, continuava linda - como podia ela conservar tal beleza após tantos anos? - seus olhos verdes como de costume eram cansados, mas seu sorriso carregava toda a graça do mundo, era encantador como o de princesas em contos de fadas – como podia continuar sorrindo após tantas chagas? - tocou o meu nariz, seus olhos lacrimejaram, por pouco uma lágrima ameaçou cair, talvez fosse pena ou coisa qualquer. Ostentou as minhas mãos e levou-as ao seu rosto, não tinha a mesma maciez de antes, mas foi incrível, ela não estava morta, eu podia sentir o seu calor, o sangue quente que o seu coração bombeava para fora das feridas. Da sua boca saia um vapor que me lembrava insistentemente um vulcão liberando cinzas, sim ela estava viva – como isso era possível?
Dos seus cabelos negros e escorridos exalava um cheiro doce de flores de laranjeira, me embriagava e me causava náuseas, mesmo assim me atraia ansiosamente, ela parecia um anjo enfeitado com asas de gente, gente como eu - como podia ela ter tantas cores em dias tão nublados? – sim ela estava viva, talvez mais viva que todos nós juntos.
Em um movimento brusco, porém de singelo carinho, me abraçou e me beijou o rosto, estupidamente continuei imóvel - ela está viva! – o mesmo pensamento se repetia incansável em mim, como ponteiros de um relógio marcando os segundos repetidos de uma vida inteira.
Depois de anos em sua ausência, senti uma vontade assustadora de empurrá-la precipício abaixo, de afogá-la naquelas águas frias, por alguns segundos senti meus olhos mudarem de cor, sendo tomados por tamanha ira, quis culpá-la por meus fracassos, perdas e medos. Ela não deveria ter me deixado, não deveria.
E antes que eu pudesse empurrá-la ou retribuir seu abraço, ela rapidamente se distanciou, me olhou nos olhos e mais uma vez pude contemplar seu sorriso, ela se foi, eu estava só novamente. Senti frio nas espinhas, um gosto amargo na boca, um peso nas costas - sim, eu estou morto! - sempre estive morto, talvez fosse o calor dela que me fizesse vivo todos aqueles anos, talvez fosse o seu cheiro que me acordasse todas as manhãs. Agora gelado e fétido, espero um lugar para repousar, uma pedra e uma data.
- Sim, eu estou morto.